Eu tenho mil razões pra te odiar. Se você fosse uma pessoa, seria, sem dúvida, uma das mais complicadas. Com os conflitos mais profundos, principalmente em relação à sua identidade. Mas você teria muito a ensinar e, sem dúvida, muitas experiências pra compartilhar. Eu escolho as boas, de qualquer modo. Lembra-se de quando eu te vi nascer e disse que tudo iria mudar, que tudo iria melhorar? Eu estava certa. De fato, tudo mudou. Pensar em quantas coisas acontecem e como minha vida mudou nesse ano é quase assustador. E as coisas melhoraram, de fato. Eu aprendi tanto...
Mas, depois de um tempo, a gente percebe que, pra aprender as lições mais difíceis, temos que passar pelos momentos mais difíceis. Pelas situações mais complicadas, que dobram os nossos olhos até que eles enxerguem de forma diferente. E às vezes, quando percebemos, a situação é mais simples do que parecia. Às vezes não há situação alguma, a não ser uma grande bagunça dentro de nós mesmos, dentro de nossas mentes, de nossas ações.
A parte mais difícil de tudo isso é quando temos que nos enxergar. Quando temos que perceber o que fazemos certo, o que fazemos errado, enfim; perceber o que fazemos. Até porque, em alguns momentos, minha concepção de certo e errado ficou indecisa. É certo, mas por que é certo? Algumas coisas conseguem ser tão erradas e tão certas ao mesmo tempo. O pior sempre acontece quando não sabemos nem o que aquilo nos faz sentir. Você me provou que os meus sentimentos são mais complicados do que eu queria que fossem e, às vezes, é preciso mais do que engolir o orgulho pra deixar tudo em pratos limpos.
Conflitos chocam, machucam, cortam, fazem sangrar. Mas conflitos também fazem o que, no fundo, todos nós precisamos: eles abrem. Eles abrem e mostram o que há por dentro, eles mostram o verso, eles mostram a outra face. Eles mostram outro ângulo. É claro que a escolha de enxergar ou não desses ângulos é sempre nossa. Nós nem sabemos, mas é. O ser humano só enxerga o que ele está pronto pra aceitar, ou o que ele simplesmente quer aceitar. Uma das coisas que eu aprendi esse ano foi parar de me aborrecer com pessoas que simplesmente fecham os olhos e enganam a si mesmas. Cada um tem a sua condição, afinal, mas ninguém pode se salvar de si mesmo.
Eu me enfrentei de todos os modos possíveis e a minha promessa mais forte pra essa virada de ano vai ser não enganar a mim mesma. Se eu não fizer isso, sei que não vou me decepcionar. Sei que não vou tapar o sol com peneira e vou saber quando não estou fazendo o suficiente pra conseguir algo. Às vezes, nós reclamamos com tanta facilidade do que acontece e dos outros, a gente reclama do que os outros deixam de fazer ou perceber, mas fechamos os olhos pra nossa parte. Dói, é verdade, porque o egoísmo trabalha sobre nós. E é claro que tudo seria mais fácil se o mundo girasse em torno de mim e todas as pessoas pensassem e funcionassem do mesmo jeito que eu, mas não é assim que acontece. E nunca será.
Depois de passar por um sofrimento que você não tem ideia de como conseguiu superar, você começa a acreditar mais em você. Você descobre que é mais forte do que pensa e que nunca, nunca mesmo, vai crescer o suficiente. Você confia mais em você mesmo. E você vê que o mais importante nem é o que você conseguiu ou não conseguiu fazer, mas sim aceitar quem você realmente é. E, quando você faz isso, é um pouco mais fácil tolerar quem os outros em sua volta realmente são.
Eu tenho muito a te agradecer, ano. Muito a reclamar, também. Mas agora é hora de dizer adeus, aquele último adeus, que sabemos que não tem volta. Espero que você sinta falta de mim e que eu realmente não sinta de você.